Prólogo
Sentados à mesa de um bar,
discutiam realidades alternativas, conspirações, futebol e mulheres. A fumaça
de cigarros nunca era uma variável, só a temperatura das bebidas. Também se
verificava na discussão, que garçonetes gostosas só existem em um universo
paralelo adolescente nerd ou em séries de TV. Gosto dessas conversas regadas a
bebida por sempre a verdade aparecer nas opiniões. Aonde o tema conspiração
chegaria?Não tem mais apelo falar do Homem não ter ido à lua. Ou se há chupas-cabras,
Nessies, Sasquatchs, aliens, etc. O nível alcoólico tinha passado já do
aceitável e como sempre alguém solta:
--E se a Alemanha ganhasse a
guerra?
Com aquela cara de medo do
sobrenatural - De imediato alguém responde.
-- Assuntinho batido, hein?Já
tem um filme sobre isso. Dos anos noventa acho.
--Sério, vi um documentário
sobre a influência Nazista na América do Sul. Impressionante... - Deixa um
ponto de interrogação um bom tempo. E se?Mas hipótese assim tem muitas
opções...
Capítulo
01
Leandro volta para casa com a
cabeça latejando de idéias e possibilidades.
”Preciso sair dessa espiral
eterna de trabalho chato, responsabilidades e tédio que minha vida me
proporciona.”
Acende as luzes da sala, liga a
TV, olha para o notebook fechado sobre a mesa de centro, a estante cheia de
livros. Deita no sofá e lembra o pensamento que há dias o perseguia.
“E se a História tivesse mais
detalhes, mais caminhos e o cenário fosse outro?”
Essa sensação de que há algo
mais.
”Deve ser parte da natureza
humana essa busca do ‘Santo Graal’ ou sei lá... Um refúgio para que a realidade
de ser poeira cósmica não nos afunde mais na chatice do ciclo
Come-Dorme-Trabalha.”
Crises existenciais de lado.
Vamos voltar ao devaneio conspiracional. Por que o tecido da realidade tem que
ser tão sólido?Quase mais forte que Adamantium?Por que a verdade tem que ser
tão impossível?
”E se?”
Pode ser uma pergunta
desafiadora. Por que negá-la? Por isso negá-la?
Respira fundo, cria coragem,
abre o notebook torcendo para que a idéia não se perca e procura os arquivos
que motivaram a conversa no bar: Uma tese de doutorado sobre o assunto onde o
documentário se baseia e o próprio vídeo do documentário. Os encontra.
Pronto!Estava embasado historicamente. Começa abrindo um arquivo novo no Word e
deixando rolar o vídeo, passa os olhos pelo arquivo pdf aberto, tentando
começar a escrever. Mas em sua idealização adolescente, deveria ser “colocar
uma folha em branco na máquina.” E como sempre, pensa em como começar a
escrever. Qual a melhor frase ou cena ou palavra...
“Por que não encontro um manuscrito de um ex-presidente revelando tudo
sobre os segredos do governo ou documentos secretos de uma experiência
realizada pelas forças armadas. Ou simplesmente, sou um gênio e crio um mundo
fantástico onde há muito tempo atrás em um lugar muito, muito distante
aconteceu uma estória.”
Era jornalista, mas não exercia a
profissão. Pensava em ser escritor. Mas a cobrança de fazer sua obra-prima já
no primeiro trabalho sempre adiava seus planos e criava um círculo vicioso de
subsistência profissional onde sobrevivia corrigindo Trabalhos de Conclusão de
Curso ou escrevendo críticas de cinema para sites voltados ao entretenimento.
“Quer saber? Dane-se! Dane-se a
fórmula, a narração, o narrador, a narrativa, a separação entre o que é minha
escrita ou a fala do narrador ou do personagem ou do alter-ego do psicopata,
adestrado estereotipado que vou criar. Preciso apenas aprender a contar a
estória. Ou deixa - lá contar-se por si própria. Quero romper com a necessidade
de me adequar ao intelecto do mercado. Que ninguém leia ou compre o livro. Que
ninguém goste ou odeie. A indiferença pode significar mais que a unanimidade.
Não penso que o que acontece em minha mente possa ser de algum proveito para os
outros. Então para que me preocupar? Vou exteriorizar o que há em mim. Dane-se”
Uma hora depois... Apenas olhando
para a tela. Desiste:
“Melhor pensar em uma estrutura
narrativa...”
Releu as regras de narratologia.
E pensou se teria sido fácil para Dan Brown ter escrito o mesmo livro cinco
vezes. Bom, por que sempre trava nessa hora?A escolha é um ato que deveria ser
mais trivial. Tantas palavras para começar e ele não sabe qual escolher. Será
que com a estrutura narrativa definida ficaria menos nebuloso o caminho?Após
anotar em uma agenda o que era para ser seguido enquanto fio narrativo. Leandro
pensava se era mais interessante seguir três atos ou deixar a trama longa e
contar vários eixos não lineares de personagens que ao decorrer vão aparecendo.
Descrever de forma detalhista e neurótica o cenário físico e psicológico ou
apenas ser testemunha dos eventos.
“João leu o livro. Gostou.
Devolveu-o a estante e foi embora da biblioteca.”
“Isso resume bem um modo
narrativo em três atos. Tem até quatro.”
Rindo de si mesmo, resolve que a
estrutura narrativa seria épica. Teria um cenário histórico, geográfico e
temporal definido e se valeria de eventos reais acompanhados de fictícios. E os
personagens?Outro tópico interessante. A estória se sustenta sem personagem ou
personagens?Existe alguma coisa assim na literatura?O evento pode ser maior que
os personagens?Um atentado terrorista ou uma guerra ou o Holocausto pode ser
maior que apenas um homem ou mulher que passou pelo evento?Penso como narrador
que a testemunha do evento deixa de ser influente na história quando o choque
causado pelo evento provoca na testemunha um horror, êxtase, torpor maior que a
emoção de quem está participando do evento. Nesse momento, a empatia ou o
sentimento de alivio por ter se livrado da tragédia-comédia passa a ser o que
define a importância da personagem.
“Malditas aulas de filosofia.”
Enfim começa a escrever (será?).
“Era uma vez um cara que queria ser
escritor, mas não conseguia escrever uma linha. Decidido a começar, ele
encontra uma foto que sugere um monte de possibilidades. Um tijolo com a
suástica. De onde seria? Para que foi usado? Quem o fez? Era real? Quais as
intenções da fabricação e da utilização? Acho que agora tenho um ponto de
partida.”
’O Tijolo Nazista’.
“Título provisório.”
Na agenda escreve:
“- Referências são realmente
necessárias? (Não sei, mas já pensei em várias);”
“- Porque tem que estabelecer tudo na
estória?”
“- É necessário em quatro minutos
de filme/livro, você já entender toda a estória?”
“- O personagem lembra que não
tem manuscritos (Operação Cavalo de Tróia, O Nome da Rosa), nem criou um mundo
mágico medieval ou em outra dimensão (Harry Potter, George Martin, Tolkien); e
baseado em Dan Brown na seguinte descrição de um blog: ‘Como escrever como Dan
Brown e vender milhões’; Cenário real, fatos históricos e ficção.”
- “Narratologia.”
Olho no papel, olho na tela.
Escreve mais tópicos:
- “Premissa”;
- ”Esquema”;
- ”Sinopse.”
Levanta para fazer um café. A noite vai ser longa.
Capítulo
2
“E agora?”
Já com o estômago azedo de tanto
café, esboço pronto e com mil idéias fervilhando em sua cabeça. Olha para a
agenda cheia de anotações, setas, quadrados com temas, idéias e tenta imaginar
se no fim de tudo, o caminho escolhido seria o ideal.Seria melhor escrever uma
realidade paralela onde Hitler estava vivo na Argentina e planejava junto com
neonazistas, uma retomada de poder na América Latina?Ou se firmar na realidade
e fazer uma reportagem?Mas os pesquisadores citados no documentário já haviam
feito isso.
“Dá próxima vez vou desenhar um
mapa, criar um mundo fantástico com elfos e dragões. Ou criar um elemento
natural que dá poder para a raça ou povo que o detém em suas terras. Assim acho
que fica mais fácil me desvencilhar de todos os problemas com a imensurável
pesquisa que vou ter que fazer para não vacilar no livro.”
“E agora? Bom, agora vou escrever
tudo que vier a mente e no fim separo o que presta do que não presta. Dan Brown
escreveu o mesmo livro sempre: Pano de fundo real; tensão sexual reprimida
entre o homem e a mulher envolvidos na estória; evento que poderia abalar todo
o tecido da realidade estabelecido pela mídia, religião e política. Personagem
comum que poderia ser qualquer um de nós. Nesses aspectos penso que a ‘tensão
sexual’ é o ponto mais importante. Mesmo a estória sendo um lixo, em nosso
inconsciente torcemos tanto para que o cara dê um beijo na moça que devoramos o
livro sem notar o óbvio da coisa toda. Bom mesmo é o James Bond, que transa com
todas, bebe Martini,dirige só carrão e ainda é inglês.Mais chique impossível. ”
Ufa!Ele descobriu que personagem
carismático era importante. Descobriu a roda. Narrador na torcida?Novidade.
“Caramba! Dan Brown como
referência? Melhor ler mais Chuck Palahniuk, Tolkien, T.H.White. Senão, para me
inspirar vou colocar um cd do Wando e depois do Richard Clayderman. O problema
dos escritores ingleses como referência (Tolkien e White), seria no fim de todo
o processo, eu tentar ser ou me tornar
um genérico de J. K. Rowling. Igual ao Rick Riordan. Que maldade. Chega de
referências.”
“O tijolo do título pode ser meu
ponto de partida. Porque no sentido de peça utilizada em construção ou parte da
construção de um muro ou parede, posso considerar que a estratégia dos nazis
era pavimentar ou construir a invasão da América Latina pela via menos
sangrenta. A via Intelectual e ideológica. Seria muito custoso e até impossível
copiar a Invasão da Normandia. Não sou militar nem servi nenhuma força militar.
Mas parece claro que subir com tropas e tanques a Serra do Mar no estado de São
Paulo é complicado. Essa barreira natural seria uma boa defesa. Invadir pelo
nordeste? Só se deslocasse o Rommel para o Maranhão e junto com ele o Afrika
Corps. Imagina? Fácil. Alguns navios com tanques e pronto. E tem mais:
Atravessar o Atlântico? E o apoio aéreo? Agora complicou de vez. Não pularam
nem o Canal da Mancha. Acho que o lógico seria fazer o que fizeram na Alemanha
antes da Guerra. Propaganda e política.”
“Nesse caso, tenho que aumentar minha
pesquisa. Receita de bolo pronta. Agora é juntar os ingredientes.”
Foi dormir.
Capítulo
3
Depois de uma pesquisa rápida
na internet. Resolve comprar alguns livros. Ficção, não-ficção, tudo que
encontrou sobre o assunto. Notou que o universo da matéria era vasto e um pouco
sensacionalista. E acho estranho não haver muito material a respeito tratando
do assunto do ponto de vista latino-americano. Tanto o que diz respeito ao
posicionamento dos governos quanto à opinião da população. Nesse aspecto pensa
em pesquisar o contexto histórico e social da época. Como era o Brasil das
décadas de vinte, trinta e quarenta? Quem eram os formadores de opinião? Qual a
mídia mais forte no âmbito popular? Rádio ou jornais e revistas? Posição do
governo? Como o Brasil era visto estrategicamente pelas nações em guerra?
“Vou aproveitar o fim de semana
para pesquisar.”
Voltava para casa, feliz e
cheio de livros.
“Era importante ter um
embasamento histórico.”
”A ambientação/embasamento
histórico parece nos oferecer certo conforto na leitura.”
“Acho que por isso tem um mapa
no começo dos livros do Tolkien e do Martin. A necessidade de localizar tudo.
Será que a estória simplesmente não pode acontecer em qualquer lugar? Cabe
agora a definição de Cenário em Narratologia: Realista, Geoficcção e
Fantástico. Meu Cenário é realista. Facilita algumas coisas, mas me prende a
outras. Terminando esse livro, talvez crie um mundo só meu. Em um Cenário
Fantástico. Fico livre de regras e crio minhas próprias.”
“Revisitando o universo de meus
sonhos. Título do próximo.”
Em casa, abre a agenda e tenta criar um
esquema para que os rabiscos da noite anterior tenham sentido e ajudem mais que
atrapalhem.
“Isaac Asimov crio as três leis
da Robótica. Chuck Palahniuk criou as regras do Clube da Luta. Preciso das
minhas.”
E enumera tudo, com um nome
curioso:
“Lista para evitar que minha
neurose atrapalhe o trabalho.”
“- 1° Escrever todo dia;
- 2° Escrever todo dia mesmo;
- 3° Nunca escrever bêbado;
- 4° Qualquer lixo pode servir;
- 5° Você não é Machado de
Assis, nem Drummond, nem José Simão;
- 6° Desencana e escreve.”
“Será que sou bipolar? Ou
tetrapolar?”
“Agora tenho que pensar em como definir
o que vou fazer.”
“Pontuando as prioridades. Devo
me preocupar em localizar o leitor no contexto social, geográfico, histórico e
político. Fazer a leitura fluir sem parecer um trabalho de quinta série ou uma
extensa tese de doutorado. É um romance histórico. Tem que ser divertido. Tem
que ter alívio cômico. Eu sou o alívio cômico? Ou minhas neuras?”
E faz outra lista.
“Perguntas a serem respondidas no
trabalho ou Lista das regras para o livro não virar sessão de terapia.”
“- Definir onde, quando, como e
por que;
- Personagens? “
“Meu Deus, de novo esse dilema do
personagem...”
“- O tijolo.”
“Que mais?”
“- Promover o livro na net?
- Testar os capítulos?
- Fazer um blog?
- Bruna Surfistinha, não!”
Capítulo 4
“Já sei!”
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