Capítulo
01
Leandro volta para casa com a
cabeça latejando de idéias e possibilidades.
”Preciso sair dessa espiral
eterna de trabalho chato, responsabilidades e tédio que minha vida me proporciona.”
Acende as luzes da sala, liga a
TV, olha para o notebook fechado sobre a mesa de centro, a estante cheia de livros.
Deita no sofá e lembra o pensamento que há dias o perseguia.
“E se a História tivesse mais
detalhes, mais caminhos e o cenário fosse outro?”
Essa sensação de que há algo
mais.
”Deve ser parte da natureza
humana essa busca do ‘Santo Graal’ ou sei lá... Um refúgio para que a realidade
de ser poeira cósmica não nos afunde mais na chatice do ciclo
Come-Dorme-Trabalha.”
Crises existenciais de lado. Vamos voltar ao
devaneio conspiracional. Por que o tecido da realidade tem que ser tão
sólido?Quase mais forte que Adamantium?Por que a verdade tem que ser tão
impossível?
”E se?”
Pode ser uma pergunta desafiadora.
Por que negá-la? Por isso negá-la?
Respira
fundo, cria coragem, abre o notebook torcendo para que a idéia não se perca e
procura os arquivos que motivaram a conversa no bar: Uma tese de doutorado
sobre o assunto onde o documentário se baseia e o próprio vídeo do documentário.
Os encontra. Pronto!Estava embasado historicamente. Começa abrindo um arquivo
novo no Word e deixando rolar o vídeo, passa os olhos pelo arquivo pdf aberto, tentando
começar a escrever. Mas em sua idealização adolescente, deveria ser “colocar
uma folha em branco na máquina.” E como sempre, pensa em como começar a
escrever. Qual a melhor frase ou cena ou palavra...
“Por que não encontro um
manuscrito de um ex-presidente revelando tudo sobre os segredos do governo ou
documentos secretos de uma experiência realizada pelas forças armadas. Ou
simplesmente, sou um gênio e crio um mundo fantástico onde há muito tempo atrás
em um lugar muito, muito distante aconteceu uma estória.”
Era jornalista, mas não exercia a
profissão. Pensava em ser escritor. Mas a cobrança de fazer sua obra-prima já
no primeiro trabalho sempre adiava seus planos e criava um círculo vicioso de
subsistência profissional onde sobrevivia corrigindo Trabalhos de Conclusão de
Curso ou escrevendo críticas de cinema para sites voltados ao entretenimento.
“Quer saber? Dane-se! Dane-se a fórmula,
a narração, o narrador, a narrativa, a separação entre o que é minha escrita ou
a fala do narrador ou do personagem ou do alter-ego do psicopata, adestrado estereotipado
que vou criar. Preciso apenas aprender a contar a estória. Ou deixa - lá
contar-se por si própria. Quero romper com a necessidade de me adequar ao
intelecto do mercado. Que ninguém leia ou compre o livro. Que ninguém goste ou odeie.
A indiferença pode significar mais que a unanimidade. Não penso que o que
acontece em minha mente possa ser de algum proveito para os outros. Então para
que me preocupar? Vou exteriorizar o que há em mim. Dane-se”
Uma hora depois... Apenas
olhando para a tela. Desiste:
“Melhor pensar em uma estrutura narrativa...”
Releu
as regras de narratologia. E pensou se teria sido fácil para Dan Brown ter
escrito o mesmo livro cinco vezes. Bom, por que sempre trava nessa hora?A
escolha é um ato que deveria ser mais trivial. Tantas palavras para começar e
ele não sabe qual escolher. Será que com a estrutura narrativa definida ficaria
menos nebuloso o caminho?Após anotar em uma agenda o que era para ser seguido
enquanto fio narrativo. Leandro pensava se era mais interessante seguir três
atos ou deixar a trama longa e contar vários eixos não lineares de personagens
que ao decorrer vão aparecendo. Descrever de forma detalhista e neurótica o
cenário físico e psicológico ou apenas ser testemunha dos eventos.
“João leu o livro. Gostou. Devolveu-o a estante e foi embora da
biblioteca.”
“Isso resume bem um modo narrativo em três atos. Tem até quatro.”
Rindo de si mesmo, resolve que a
estrutura narrativa seria épica. Teria um cenário histórico, geográfico e
temporal definido e se valeria de eventos reais acompanhados de fictícios. E os
personagens?Outro tópico interessante. A estória se sustenta sem personagem ou
personagens?Existe alguma coisa assim na literatura?O evento pode ser maior que
os personagens?Um atentado terrorista ou uma guerra ou o Holocausto pode ser
maior que apenas um homem ou mulher que passou pelo evento?Penso como narrador
que a testemunha do evento deixa de ser influente na história quando o choque
causado pelo evento provoca na testemunha um horror, êxtase, torpor maior que a
emoção de quem está participando do evento. Nesse momento, a empatia ou o
sentimento de alivio por ter se livrado da tragédia-comédia passa a ser o que
define a importância da personagem.
“Malditas aulas de filosofia.”
Enfim começa a escrever
(será?).
“Era
uma vez um cara que queria ser escritor, mas não conseguia escrever uma linha. Decidido
a começar, ele encontra uma foto que sugere um monte de possibilidades. Um
tijolo com a suástica. De onde seria? Para que foi usado? Quem o fez? Era real?
Quais as intenções da fabricação e da utilização? Acho que agora tenho um ponto
de partida.”
’O Tijolo Nazista’.
“Título provisório.”
Na agenda escreve:
“- Referências são realmente necessárias?
(Não sei, mas já pensei em várias);”
“ - Porque tem que estabelecer tudo na estória?”
“- É necessário em quatro minutos
de filme/livro, você já entender toda a estória?”
“- O personagem lembra que não tem manuscritos (Operação Cavalo de
Tróia, O Nome da Rosa), nem criou um mundo mágico medieval ou em outra dimensão
(Harry Potter, George Martin, Tolkien); e baseado em Dan Brown na seguinte
descrição de um blog: ‘Como escrever como Dan Brown e vender milhões’; Cenário real,
fatos históricos e ficção.”
- “Narratologia.”
Olho no papel, olho na tela.
Escreve mais tópicos:
- “Premissa”;
- ”Esquema”;
- ”Sinopse.”
Levanta para fazer um café. A noite vai ser
longa.
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